"NASCI ANTES DO TEMPO"
Tudo que criei e defendi
nunca deu certo
Nem foi aceito
E eu perguntava a mim mesma
Por quê?
Quando menina,
ouvia dizer sem entender
quando coisa boa ou ruim
acontecia a alguém:
fulano nasceu antes do tempo.
Guardei.
Tudo que criei, imaginei e defendi
nunca foi feito
E eu dizia como ouvia
a moda de consolo:
nasci antes do tempo.
Alguém me retrucou:
você nasceria sempre
antes do seu tempo.
Não entendi e disse Amém.
Cora Coralina
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O silêncio por trás do adeus
Costumo falar que namorei cinco anos....mentira! Até porque como boa mulher que sou, arredondo tudo conforme minha conveniência.
Namorei quatro anos, oito meses e exatos dois dias e o fim, demasiadamente estranho, foi mais ou menos assim: era de 2 de novembro de 2012, estávamos deitados, vendo algum filme, que provavelmente não devia interessar a nenhum de nós dois, mas há coisas que se faz em namoros longos que estão simplesmente atreladas ao hábito, portanto não existe questionamentos.
-Rafa, pega água pra mim! e eu pedi exatamente assim, sem "por favor", sem a voz doce, necessária quando se quer algo, que talvez você possa não conseguir.
Ele levantou, voltou com o copo cheio, parou em frente à cama, deu um passo para trás, acomodou o copo na cômoda e disse:
-Julia, acabou!
-Acabou o quê, Rafael? A água? respondi com a mesma inexpressão e agora um pouco menos de paciência.
-Não a água...nós dois...acabou! tentou ele ser mais objetivo.
Pronto....o vazio se instalou, tive várias sensações: vontade de rir, de chorar, uma leve tontura, um alívio, medo, vontade de gritar, de correr...mas simplesmente respondi:
-Acho melhor assim! Já não está dando certo mesmo!
Ele olhou bem nos meus olhos, e não é que pela primeira vez eu não reconheci sequer uma expressão do seu rosto, logo aquele rosto que eu era tão acostumada a olhar...nada! Seu olhar me remeteu a nada!
Nós não choramos, não nos abraçamos, e por um período tão longo que eu nem conseguiria descrever, ficamos em silêncio...o único movimento que fazíamos é o que nos mantérm vivos: nós respirávamos...e só! E o silêncio foi tão alto, mas tão alto, que mesmo estando a uma considerável distância, eu ouvia a respiração dele...calma, compassada...determinada!
-Você vai levar suas coisas hoje? perguntei.
-Não! Vou embora agora, depois eu pego! ele respondeu com a mesma tranquilidade do início da conversa. -Quer a água? ele ainda acrescentou meramente pelo costume de ser educado.
-Não! Não quero mais nada!
-Ok... ele respondeu, apenas duas letras, que indicavam o fim de uma hitória longa que já foi tão cheia de palavras inteiras, que jamais seriam ditas novamente.
Ele caminhou até a porta, eu então levantei da cama, e quando cheguei na cozinha, ele já estava do lado de fora:
-Tchau Julia!
-Tchau Rafael! Algum dia vamos nos ver novamente?
-Não tão cedo..vai ser melhor para nós dois!
-Vou sentir saudades! falei, sem ter certeza de que era verdade o que eu dizia, ou a tal da "forçao do hábito".
-Eu também vou... ele me surpreendeu com a resposta.
-Então tá! emendei já visando não prolongar o assunto.
E ele foi embora...observei-o pela última vez sair pelo portão por onde tantas vezes o vi entrar...sempre sorrindo, estávamos sempre felizes pelo reencontro...desviei o olhar, como quem diz a si mesma:
-Pára! Acabou....
Entrei, tranquei a porta, já não me recordo se a televisão ainda estava ligada ou não, e não fiz absolutamente nada! E o silêncio, sabe aquele que algumas linhas atrás eu disse que estava alto demais, então...agora ele era ensurdecedor!
Deitei-me novamente na cama, no mesmo lugar em que eu estava quando pedi aquele copo de água... e de todas as coisas que eu poderia ter feito naquela hora fiz a menos provável: me ajeitei espaçosa e confortavelmente pela primeira vez em "cinco anos" na minha cama de casal, tomando incoscientemente posse de algo que a partir de agora me pertencia por inteiro... e dormi! Afinal quando eu acordasse nada mais seria igual...
Dedico essa crônica a mim mesma desta vez...aos meus 365 dias comemorados após o fim...sobrevivi!